sábado, 29 de janeiro de 2011

Meu primeiro Ronaldo Gaúcho


Éramos Vinte.


Vivo sonhando acordado e não é que acabei sonhando dormindo? Outro dia sonhei com o Ronaldo Alves Moreira, alguém que não vejo e nem falo há mais de vinte anos.
No quartel ele tinha o nome de Moreira. Eu e outros o chamávamos de Gaúchinho, uma pessoa muito inteligente e esforçada.
Quando fizemos o Curso de Formação de Sargentos Topógrafos do Exército, no Rio, em 1982, dentre nós vinte alunos, ele era cotado pra ser o "Zero Um" - como são chamados os primeiros colocados em curso militar. Num curso de dez meses de duração, ele deve ter ficado no topo das notas mais altas por mais de sete meses, mas sua calculadora "truncou", durante uma prova, e ele perdeu três posições, o suficiente para desqualificá-lo numa das vagas de Porto Alegre.
A luta entre os gaúchos para retornar ao estado natal era ferrenha. Chegava a ser desonesta, pois alguns roubavam "papiros" - como são chamados os livros de estudos militares - dos outros colegas, para impedílos de estudar.
O Ronaldo, até diante o bandeijão de comida, tinha o papiro aberto à sua frente. Mastigava estudando, dormia estudando e não dava trégua a si mesmo. Era um tal de riscar, sublinhar, colorir e colocar palavras de incentivo em cada página dos livros; tipo assim: Vá em frente, Ronaldo; Leia de novo, Ronaldo; Porto Alegre espera teu filho; Volte duas páginas...
Eu o achava o máximo. Eu pretendia ir pra Brasília e as vagas não eram assim tão disputadas - o que me dava um certo confoto! Dos vinte, eu, mesmo malandramente, fiquei em oitavo lugar com a nota oito ponto sessenta e oito. Uma turma forte, jamais vista por aquele centro de ensino. Quinze notas "MB" separadas por centésimos de conhecimento.
O Ronaldo era um "caxias" de marca maior, coisa inerente aos militares gaúchos. Fez inimizades homéricas durante seu xerifado, período em que comandou, nós, seus companheiros.
Abriram-se três vagas pra Brasília e, junto comigo e meu compadre, escoltamos-o para a capital federal, único reduto que estaria entre simpatizantes.
Fomos então distribuídos em três funções diferentes - Um para a instrução dos recrutas, um para a contabilidade e o último pra o Rancho. O Ronaldo, competente até debaixo dágua, tinha precedência sobre nós e escolheu, graças a Deus, a instrução. Eu tinha precedência sobre meu compadre gordinho e poderia ter escolhido a contabilidade, mas fui seduzido por ele a escolher a Cozinha, pois ele lá iria engordar ainda mais. O que não se faz pelos amigos, senão obedecê-los?
O Ronaldo era o terror! Nunca vi alguém vibrar tanto com a caserna. Ele fez um Plano de Defesa do Aquartelamento tão perfeito que vigora até os dias de hoje.
Em pouco tempo ele saiu do Exército, pois passou no Concurso do Banco do Brasil que era mais rentável à época. Sei que se deu um ótimo bancário e sua carreira foi promissora por lá também, mas foi o militar mais garboso que conheci, ao contrário de mim um tanto relapso e que assim passou uma vida aprisionado à farda, a menor jaula do mundo, brincávamos, por caber apenas um animal dentro.
Éramos vinte, mas em pouco tempo, talvez menos de cinco anos de formação, já estávamos reduzidos à metade. Nossos amigos foram pra Petrobras, Eletronorte e outras tantas estatais de porte.
O Miguel Lotário Knigler, nosso primeiro colocado, formado também em Direito, passou no Banco Central, onde o seu coronel chefe bombou. Ingressou no Ministério Público e deve ter alçado voo sem limite das minhas vistas alcançar!
Eu, ainda em Brasília, certa vez, quis fazer um encontro da turma, mas desisti, pois meu primeiro contato de organização foi com o Ronaldo Gerente e ele entusiasmou-se por demais. Queria que, durante o evento, fizéssemos Teste Físico Militar, Tiro, Pentatlo, Corrida Rústica e uma partida de futebol entre os que saíram contra os que ficaram. Pareceu-me um pesadelo e abortei a missão. Pensava eu em muita conversa, comida e bebida!
... Sonhei que ele tinha sob seu comando uma grande carteira de investimento internacional e que, junto com ele, eu caminhava pelos seus domínios. Na repartição bancária dos meus sonhos, o tempo todo Ronaldo estava fardado, mas com os bolsos cheios... como o outro - Tudo pela Pátria!

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