sábado, 30 de maio de 2009
Temos que ter fome.
Bóia-Fria
Tenho calos nas mãos de quando trabalhei duro. Eles nunca me abandonaram, por isso eu não me calo.
Para minha mãe, grande educadora, bastava que o filho tivesse o Quarto Ano, hoje Quarta Série. Sabendo ler e escrever já se encontrava no ponto de procurar serviço pra ajudar nas despesas. Eu sempre trabalhei e não vi a necessidade de parar de estudar para isto. Briguei por isto. Achava desonesto meu pouco ganho servir de renda a outros irmãos, inclusive mais velhos, sem serviço, vulgo desocupados.
Vendi chuchu, catei pedras que viravam areia de branquear panelas, recolhi estrume de eqüinos que viravam adubos, peguei feixe de lenha no mato e fui bóia-fria, dentre outras peripécias, só não podia atrapalhar meus estudos. Trabalhava fora do horário de escola, férias e fim-de-semana.
No cafezal era assim o pagamento das diárias: Os coveiros ganhavam vinte cruzeiros, os homens quinze, as mulheres dez os meninos cinco. Eu ganhava trinta porque tinha estudo e fazia o controle das presenças, montava os envelopes de pagamento e contava pés de café capinados de empreita. Utilizando a multiplicação e adição, contava até seis ruas de uma vez, pois os pés de café eram alinhados – coisa que ninguém ali sabia fazer.
Antes disso, porém, eu ralei bastante até gerar confiança. Distribuí mudas para as covas abertas, enchi saquinho de terra e corri junto com trator pulverizando a cultura.
Uma coisa que não me esqueço são os versos que ia compondo na madrugada, estrada poeirenta afora, na carroceria do caminhão: “Seu Ranunfo, o senhor pra nóis é um triunfo”; “Sueli baixa, Sueli alta, em nosso serviço Sueli não falta”... Piadas com eles tinham mais graça e elas choviam de todos os lados. Os banguelas riam sem medo de serem felizes.
Recordação triste eu tenho de um sujeito que foi até candidato a prefeito. Eu e meu irmão menor colhemos maracujás pra ele. Pagou-nos tão barato que o dinheiro não deu pra pagar nem uma garrafa de guaraná Maçã e um pão com salame, matula que a gente levava de lanche.
Apesar das dificuldades presentes acho que trabalho nunca falta – o que falta aos desempregados é a ganância.
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