sábado, 9 de janeiro de 2010
Do alto do microfone
EU E BORIS CASOY
Na virada do ano, enquanto veiculava na TV BANDEIRANTES uma notícia referente à Super Mega-sena, houve um vazamento de áudio.
Na matéria, dois senhores uniformizados em tom laranja, cabelos parcos grisalhos e bocas não completas, mas com sorrisos largos, desejavam aos telespectadores muitas felicidades, muita saúde e muito trabalho. Eram garis, com certeza, com aposentadorias próximas, uma gracinha.
Boris Casoy, o âncora do “é uma vergonha”, despreocupadamente, pensando não estar no ar, comenta com “Joelmir Beting”, seu companheiro de altar: “Que merda... dois lixeiros... do alto de suas vassouras... desejando felicidades... o mais baixo na escala do trabalho...”
Confesso que me desanimei mais uma vez com os homens. Será que Boris, no alto do seu microfone, está na mais alta escala de trabalho? Escala de julgamento?
O trabalho de Boris também é um trabalho sujo, tanto que há bem pouco tempo era um ilustre desempregado.
Ele pediu, no dia seguinte, profundas desculpas aos garis, mas o reparo deveria ser maior.
Eu, por exemplo, sintonizava-o e não sei se o farei novamente. Na minha escala de ídolos ele foi demitido.
Pediu desculpas somente aos garis, mas ele feriu muito mais, inclusive filhos de garis.
Qualquer que seja a dimensão dada à escala do trabalho de gari, ela sempre será a mais elevada sob o meu conceito.
Saiba, Sr Boris, que quando eu vejo um gari, um carrinho, uma vassoura e uma pá, meus olhos vertem o mais puro sentimento.
Meu pai com o salário mínimo obtido ao mês, na Prefeitura de Araguari, recolhendo o lixo nosso de cada dia é que nos proporcionava o pão.
Meu pai era lixeiro e me sorria dizendo – ki cheiro! De tudo que fiz nesta vida o que me trouxe mais gratidão era a tarefa que eu abraçava de lhe levar a marmita com o seu almoço. Fazia o percurso correndo pra comida chegar quentinha.
Na sua hora de almoço, sempre na Rua Marciano Santos confluindo com a Avenida Bahia, às margens do então descoberto Córrego Sanitário, ele era o homem a quem mais eu devia respeito e ensinamento. Ninguém me ensinou mais que ele. Seria uma vergonha sentir-lhe vergonha.
Desculpas, Boris, profundas desculpas... não conterão meu vazamento visual.
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1 comentários:
Eu nunca tive o hábito de ver o programa desse ilustre cidadão, mas, ao que se vê, se ele desejar felicidades a todos vai ter muita força. Sempre achei que quando ele diz que alguma coisa é uma vergonha o escárnio era tão generalizado contra os eleitores que eles mesmos que são ouvintes dele talvez não se apercebessem que a culpa é de toda a sociedade que, além de criar os sistemas existentes, colocou os vergonhosos algozes para gerir a coisa pública. Pena que não se apresentam por estas paragens bloguísticas nem as autoridades para esclarecer nossas questões políticas nem as autoridades eclesiásticas para falar da maior máxima cristã sobre o próximo. Mas não sei qual de nós estaria, segundo a ótica da crítica boriscasoística, em condições de desejar felicidades aos demais cidadãos. Eu, por exemplo, sou lixeiro na minha casa, mas não é essa minha atividade principal. Não deixo nem permito que deixem restos de comidas sobre a pia durante a noite (que evita formigas e baratas). Sempre que em qualquer parte da casa eu encontro lixo eu recolho imediatamente, acondiciono em plásticos e coloco no local certo e de acordo com o tipo de material (coleta seletiva). Nunca deixo a lixeira cheia por muito tempo e logo levo para local para destinação final, assim como fazem todos os lixeiros. Portanto, sou lixeiro; não daqueles que pegam meu lixo e levam para outro local, mas faço a faxina na minha casa, até porque não tenho empregados. Tarefa sagrada essa minha, limpeza é sagrada é espiritualmente elevada a sensação de viver em lugar cheiroso e limpo. Então, os lixeiros podem desejar a felicidade a todos já que zelam por manter sagrados os lugares de todos nós. É claro que cada um em suas casas são lixeiros e se não fossem os maus faxineiros o planeta não estaria tão sujo. Na escala social, como disse o jornalista, então não seria essa a classificação que impediria alguém de desejar felicidades. O próprio Boris (que talvez more em lugar limpo e gosta de limpeza e se não a faz deve contratar alguém para fazê-la) também pode desejar felicidades a outros já que do alto de seu microfone ao menos deve fazer a faxina da sua própria bunda, além de escovar a própria boca depois de tanta coisa vergonhosa que sai dela.
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